O zelo missionário

«Aquele que é chamado para a Congregação do Santíssimo Redentor não será nunca verdadeiro discípulo de Jesus Cristo nem chegará jamais a ser santo, se não corresponder aos fins da sua vocação e não tiver o espírito do seu Instituto que é de salvar almas e entre elas as mais necessitadas, as mais privadas de auxílios espirituais, como são as pobres gentes do campo.

Com este intento veio Jesus Cristo ao mundo como formalmente declarou por estas palavras: «O Espírito do Senhor está sobre mim, por quanto me ungiu; para evangelizar aos pobres me enviou» (Lc 4,18 ). Em nada quis experimentar a sinceridade do amor de S. Pedro, senão encomendando-lhe a guarda das suas ovelhas: «Simão, filho de João, amas-me? Apascenta as minhas ovelhas» (Jo 21,17). Não Ihe impôs, diz S. João Crisóstomo, penitência, orações, ou outro qualquer trabalho, mas apenas que cuidasse de salvar as suas ovelhas: Não Ihe disse Jesus Cristo: abandona as riquezas, jejua, macera-te com trabalhos; mandou-lhe: apascenta as minhas ovelhas. E nosso Senhor Jesus Cristo foi até ao ponto de declarar que considerava como feito a si mesmo todo o beneficio que fizéssemos aos humildes: «Em verdade vos digo, quanto fizestes a um dos meus irmãos mais pequenos. a mim o fizestes» (Mt 25,40).

Todo o religioso deve, pois, alimentar este sonho, inflamar-se neste zelo, cultivar este espírito de salvar almas. Para este fim há-de dirigir todos os seus estudos. E, quando os superiores o destinarem para este oficio, nele tem de por todo o seu empenho e atenção, Não poderia crer-se verdadeiro filho desta Congregação quem não aceitasse com todo o afecto está ocupação, quando a obediência lha impusesse, com o pretexto de atender só a si mesmo levando vida retirada e solitária.

E que maior gloria para um homem do que ser cooperador de Deus, como diz S. Paulo, nesta grande obra da salvação das almas? Quem ama a Deus com amor sincero não se contenta com ser só a amá-lo, o seu supremo anelo será atrair todos para esta fogueira divina e dirá com David: «Cantai a Javé suas grandezas comigo, de forma que juntos exaltemos seu nome» (Sal 33,4). Dai vem Santo Agostinho a exortar todos os que amam a Deus: «Se amais a Deus, arrastai todos para o seu amor».

Razão bem fundada pode ter de esperar a salvação eterna aquele que se entrega com verdadeiro zelo a salvação das almas dos outros. É o mesmo Santo Agostinho que vem corroborar o nosso asserto: «Salvaste uma alma? Predestinaste a tua». E o Espírito Santo nos promete por Isaías: «Quando deres teu pão ao faminto (quer dizer quando tiveres trabalhado pelo bem do pobre) e saciares uma alma humilhada (isto é quando com as tuas obras a tiveres enchido de graça) irradiarei nas trevas a tua luz» (Is 58,10). O Senhor inundará a alma de luz e dos seus dons. S. Paulo colocava a esperança da sua salvação eterna, na salvação que ele procurava para os outros, e por isso dizia aos seus discípulos de Tessalónica: «Pois qual é a nossa esperança, o gozo, a coroa de gloria na presença de nosso Senhor Jesus Cristo em sua vinda? Porventura não sois Vós? Sim, vós sois a nossa glória e gozo» (I Tess.2,19).

Senhor meu Jesus Cristo, como poderei eu agradecer-Vos suficientemente por me terdes chamado a desempenhar o mesmo oficio que Vós quisestes exercer na terra: andar empenhado com os meus trabalhos a ajudar as almas a salvarem-se? Como mereci eu esta honra e este prémio, depois de Vos ter ofendido tão gravemente e de ter sido ocasião de outros Vos terem ofendido também?

O Jesus, meu Salvador, já que me chamais a cooperar convosco nesta grande empresa, quero empenhar nela todas as minhas forças. Ofereço-vos, Senhor, todas as fadigas, o próprio sangue, a vida para Vos obedecer. Não pretendo com isto seguir a minha inclinação ou conseguir dos homens aplausos e estima; o meu único fito é ver-Vos amado de todos como mereceis.

Bendigo a minha sorte e tenho-me por feliz, porque Vós me elegestes para este grande ministério. E, ao desempenhá-lo, proponho-me renunciar a todos os louvores dos homens, a todas as minhas satisfações; só uma coisa almejo: a Vossa glória. Seja para Vós toda a honra e glória e para mim somente os trabalhos, os vitupérios e humilhações. Aceitai, Senhor, o oferecimento que vos faz um mísero pecador, que só aspira a amar-Vos e a ver-Vos amado dos outros; dai-me forças para cumprir o meu propósito.»
A VOCAÇÃO RELIGIOSA, escrito em 1771

2 comentários:

Sol da manhã disse...

Olá Rui Pedro!

É este o X-File?!

"«Aquele que é chamado para a Congregação do Santíssimo Redentor não será nunca verdadeiro discípulo de Jesus Cristo nem chegará jamais a ser santo, se não corresponder aos fins da sua vocação e não tiver o espírito do seu Instituto que é de salvar almas e entre elas as mais necessitadas, as mais privadas de auxílios espirituais,"...

Mas está datado de 1771 e a congregação recebeu aprovação papal em 1749. Demorou assim tanto tempo?! Acho que me falta aqui qualquer coisa para eu entender mesmo isto. :)

Que BONITO!!!
"Não Ihe impôs, diz S. João Crisóstomo, penitência, orações, ou outro qualquer trabalho, mas apenas que cuidasse de salvar as suas ovelhas: Não Ihe disse Jesus Cristo: abandona as riquezas, jejua, macera-te com trabalhos; mandou-lhe: apascenta as minhas ovelhas. E nosso Senhor Jesus Cristo foi até ao ponto de declarar que considerava como feito a si mesmo todo o beneficio que fizéssemos aos humildes: «Em verdade vos digo, quanto fizestes a um dos meus irmãos mais pequenos. a mim o fizestes» (Mt 25,40)."


Sto Afonso era muito à frente!...
Estou a gostar mesmo muito!

Um abraço.

SHALOM

Rui Vasconcelos disse...

Olá Maria! É certa a tua pergunta: de facto, Afonso publicou um livro chamado "A Vocação Religiosa" para todos os religiosos em geral. Mas as Considerações - como a 13ª ou o X-file como gosto de lhe chamar - são anteriores, penso que de 1752, mais ou menos. Eram tipo circulares internas - depois é que foram publicadas.

Normalmente havia um grande periodo entre o nascimento dos textos e a sua publicação - penso que os textos de Afonso começavam por ser utilizados nas missões ou entre os redentoristas, e depois eram publicados.

E, sem dúvida, Afonso era mesmo à frente!Como advogado, era prático e claro; como missionário, sabia o que era importante para as pessoas; como apaixonado, era capaz de mostrar este rosto de Boa-Nova!

Um abraço!