Prática de amar a Jesus

Partilhamos agora três pequenos textos de Afonso, entre as dezenas de obras que publicou. Naturalmente que precisamos de aceitar a linguagem própria do séc. XVIII no qual foram escritos; mas parece-nos que podem continuar com uma grande actualidade, hoje.
«Toda a santidade e perfeição da alma consiste em amar a Jesus Cristo, nosso Deus, nosso sumo bem e nosso Salvador. Aquele que me ama, diz o mesmo Jesus, será amado do meu eterno Pai: «O mesmo Pai vos ama, porque vós me amastes» (Jo 16, 27). Alguns, diz S. Francisco de Sales põem a perfeição na austeridade de vida, outros na oração, estes na frequência dos sacramentos, aqueles nas esmolas. Mas enganam-se: a perfeição consiste em amar a Deus de todo o coração. O Apóstolo Paulo escreveu: «Acima de tudo… tende caridade, que é o vínculo da perfeição» (Col 3, 14). A caridade é aquela virtude que une e conserva todas as virtudes que fazem o homem perfeito. Pelo que dizia S. Agostinho: Ama e faz o que quiseres, porque uma alma que ama a Deus, o mesmo amor lhe ensina a não fazer coisa que lhe desagrade, e a fazer tudo o que lhe agrada.

Não merece Deus, porventura, todo o nosso amor? Ele nos amou desde toda a eternidade. «E com amor eterno te amei» (Jer 31, 3). Homem, diz o Senhor, olha que fui eu o primeiro a amar-te. Tu não existias ainda no mundo, nem o mundo tampouco existia, e já eu te amava. Amo-te desde que sou Deus. Desde que me amei, amei-te também a ti.

Vendo Deus que os homens se deixam levar dos benefícios, quis por meio dos seus dons cativá-los ao seu amor. Por isso disse: «Eu os atrairei com os laços próprios dos homens; com as prisões da caridade» (Os 11, 4). Quero atrair os homens a amar-me com aqueles laços com que eles se deixam prender, isto é, com os laços do amor. Tais precisamente têm sido todos os dons feitos por Deus ao homem. Depois de tê-lo dotado de alma com as potencia feitas à sua imagem, memória, entendimento e vontade; e de corpo com os seus sentidos, criou para ele o céu e a terra e tantas outras coisas, todas por amor do homem: os céus, as estrelas, os planetas, os mares, os rios, as fontes, as montanhas, as planícies, os metais, os frutos e tantas espécies de animais, a fim de que sirvam o homem, e o homem o ame a Ele em agradecimento de tantos dons. O céu e a terra – exclama S. Agostinho – e todas as coisas exortam-nos a amar-vos. Senhor meu – dizia – quantas coisas vejo na terra e acima da terra, todas me falam e persuadem a amar-vos, porque todas me dizem que por amor de mim vós as fizestes.

Mas não se contentou Deus com dar-nos todas estas formosas criaturas. Para conquistar todo o nosso amor, a tudo acrescentou o dar-se a si mesmo todo a nós. Sim, o eterno Pai chegou ao extremo de nos dar o seu próprio e único Filho: «Porque Deus amou de tal modo o mundo, que lhe deu o seu Filho Unigénito» (Jo 3, 16). Pelo seu amor imenso, melhor – como escreve Paulo – pelo excessivo amor que nos tinha, mandou o seu Filho, e juntamente com o seu Filho nos deu todos os bens, a sua Graça, o seu Amor, o Paraíso, pois que todos esses bens são certamente menores que o Filho.

Assim, é um grande erro o que afirmam alguns: Deus não quer a todos santos. Não, diz Paulo: «Esta é a vontade de Deus: a vossa santificação» (1Tess 4, 3). Deus quer a todos santos, cada um no seu estado: o religioso como religioso, o secular como secular, o sacerdote como sacerdote, o casado como casado, o negociante como negociante, o soldado como soldado, e assim a respeito de qualquer estado.»
A PRÁTICA DE AMAR A JESUS CRISTO, escrito em 1768

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