A Redenção como acção do Espírito Santo

Quando falamos de Redenção, há determinados erros que devemos evitar e corrigir, na nossa linguagem como no nosso pensamento:
· Anulando ou esquecendo todo o ministério de Jesus, a sua acção, o seu anuncio: é ali que encontramos o modo como a Redenção acontece, no contacto pessoal libertador com todos os marginalizados, pecadores;
· Concentrando-nos na morte na Cruz e esquecendo o processo pascal de Ressurreição de Jesus, separando Redenção e Salvação como assunção da Humanidade na Comunhão Eterna e Plena com Deus;
· Finalmente, colocando a Redenção como um acto acontecido num dado momento do passando, esquecendo que continua hoje, que é um processo apenas inaugurado por Jesus!

Sobretudo, compreendendo a linguagem bíblica e a interpretação que o Novo Testamento dá da Salvação inaugurada em Jesus, damo-nos conta:
· A Redenção não é uma acção, um sacrifício realizado pelo Homem, mas por Deus, e não tem como fim mudar os sentimentos de Deus, mas transformar e reconciliar o Homem!
· A destruição do pecado acontece pelo Amor de Deus que é uma Pessoa Divina, que actua no nosso interior gerando-nos na santidade, que nos vem da Comunhão com Cristo Ressuscitado, e que se chama Espírito Santo!

Para isso é também importante olharmos para o pecado do Homem segundo os olhos de Deus: considerando-o como vitima e não como culpado, cuja resposta é a cura e libertação, e nunca o castigo e a condenação. É belo como, falando do ministério da reconciliação, Afonso considere o confessor mais como médico que como juiz (Prática do Confessor). A Adúltera apresentada a Jesus no Templo é recriada como uma pessoa nova pela força do perdão: ela, que estava condenada, é salva para a vida: Tampouco eu te condeno. Vai, e de agora em diante não peques mais (Jo 8, 11). Do mesmo modo, o filho que regressa a casa recebe imediatamente a melhor veste, o anel no dedo e as sandálias nos pés, da parte do Pai que o recebe lançando-se ao pescoço e beijando-o (Lc 15, 11-32). É esta a acção de Deus connosco, é este o mistério da Redenção!

“É a santidade santificante de Deus que vem antes, e as considerações sobre o pecado a expiar vem apenas depois. Aquela santidade é um amor sem fronteiras, totalmente gratuito; um amor que invade o mundo antes de qualquer reparação do pecado. Este vem reparado, abolido no acolher que se faz amor. Jesus é o mediador daquele acolhimento” (F.X. Durrwell cssr). O Espírito Santo comunicado na Páscoa de Jesus é a Vida Divina, Vida do Amor Eterno e Pleno do Pai e do Filho, que circula nos circuitos interior-relacionais da Humanidade e a transforma. Nesta Comunhão Eterna e Plena do Pai e do Filho a que somos chamados e assumidos, está a melhor “medicina” que se possa imaginar para todo o pecado!

«Consagra-os na verdade: a verdade é a tua Palavra. Assim como Tu Me enviaste ao mundo, Eu também os envio ao mundo. Eu consagro-Me por eles, a fim de que também eles sejam consagrados na verdade. Eu não Te peço só por estes, mas também por aqueles que vão acreditar em Mim por causa da sua palavra, para que todos sejam um, como Tu, Pai, estás em Mim e Eu em Ti. E para que também eles estejam em Nós, a fim de que o mundo acredite que Tu Me enviaste. Eu mesmo lhes dei a glória que Tu Me deste, para que eles sejam um, como Nós somos um. Eu neles e Tu em Mim, para que sejam perfeitos na unidade e para que o mundo reconheça que Tu Me enviaste e que os amaste, como Me amaste a Mim. Pai, aqueles que Tu Me deste, quero que eles estejam comigo, onde Eu estiver, para que eles contemplem a glória que Me deste, pois Me amaste antes da criação do mundo» (Jo 17, 17-25).

“O pecado não existe em si próprio, de modo a poder cancelá-lo ou não o imputar; existem homens pecadores, mortos à Vida Eterna: o seu pecado vem expiado quando Deus converte o pecador, fazendo-o viver na sua vivificante santidade” (F.X. Durrwell cssr). A destruição do pecado não acontece pela morte do pecador, como pretendia a lei mosaica e como anunciava João Baptista (Mt 3, 10). A destruição do pecado acontece pela conversão do pecador que, na experiencia do Amor e do Perdão de Deus no seu interior, através do Espírito Santo, iluminada pela Palavra do Evangelho, mediada pelos discípulos de Jesus que formam o seu Corpo e acolhida na Fé, o conduz a viver e a construir-se no Amor, realizando a sua vocação e nascendo como o Homem Novo.

Agindo no coração do Homem, todas as suas acções e opções, todas as relações que vive, a história que constrói, são convertidas pelo Espírito Santo. É aí que acontece a sua purificação: Jesus disse: «Será que nem vós entendeis? Não compreendeis que nada do que vem de fora e entra numa pessoa pode torná-la impura, porque não entra no seu coração, mas no estômago, e vai para a privada?» (Assim Jesus declarava que todos os alimentos eram puros). Jesus continuou a dizer: «O que sai da pessoa é que a torna impura. Pois é de dentro do coração da pessoa que saem as más intenções, como a imoralidade, roubos, crimes, adultérios, ambições sem limite, maldades, malícia, devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de juízo. Todas estas coisas más saem de dentro da pessoa, e são elas que a tornam impura» (Mc 7, 18-23).

“Agora, na Humanidade, a justiça é formada pela Fé, Esperança e Caridade num caminho teologal, e torna-se diferente como resultado. Os seus símbolos são a Incarnação e a Ressurreição, que juntos são a transfiguração e renovação do nosso mundo presente” (Kevin O’Shea cssr). Jesus confia aos seus discípulos, guiados pelo Espírito, de construir este Reino de justiça, paz e alegria do Espírito Santo (Rm 14, 17), vivendo à imagem do Amor de Deus e em comunhão com Ele. Agora vemos como em espelho e de maneira confusa; mas depois veremos face a face. Agora o meu conhecimento é limitado, mas depois conhecerei como sou conhecido. Agora, portanto, permanecem estas três coisas: a fé, a esperança e o amor. A maior delas, porém, é o amor (1Cor 13, 12-13).

Não é possível separar Redenção de Salvação, como não é possível separá-la da Ressurreição. Estamos no coração da fé crista. A acção e o projecto de Deus são uma acção e um projecto de Amor, que irrompe na Humanidade em Cristo e a transforma. O Projecto Criador chega à sua plenitude com a ressurreição em toda a Economia da Salvação, como diz S. Ireneu. Se o pecado entra na história humana, Deus diz: é mau, as minhas criaturas estão a sofrer, mas o Amor é mais forte! A acção do Espírito que gera e ressuscita os homens como filhos, também os cura de todo o que não lhes deixa ser felizes.

“Quando aconteceu o pecado, Deus livremente recusou-se a permitir que o pecado interferisse com o seu plano original para a Criação. Recusou-se a manter o pecado contra a Humanidade pecadora. Em vez disso, em virtude do mesmo princípio da bondade e justiça de Deus, Deus utilizou o pecado como uma ocasião para uma maior bondade, ou melhor, para uma continuação sem falha da sua bondade e uma amplificação transcendente dela. Deus insiste no Dom e a doação continua. É uma recapitulação do acto original, agora tornada mais visível pelo uso bondoso da nova ocasião. Deste modo Deus permite que a Humanidade pecadora regresse à sua Origem Criadora; Deus conduz-la ao movimento original do Divino Amor” (Kevin O’Shea cssr).

O Reino inaugurado em Cristo, Reino de Comunhão, torna-se uma frente de humanização e libertação para todos os oprimidos, escravizados e abandonados deste mundo – como Jesus bem o demonstrou na Galileia dos Gentios.

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